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"Labubu, logo existo? A caça ao boneco e o vazio que não desaparece"

  • Foto do escritor: Ana Rita Rebelo
    Ana Rita Rebelo
  • 30 de jul.
  • 3 min de leitura

Este artigo é assinado pela psiquiatra Inês Costa Maia, especializada em perturbações de personalidade.


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Se nunca ouviu falar de um Labubu, talvez esteja a viver com uma distância saudável do TikTok/Instagram e do universo Pop Mart, algo que é admirável. Mas se já deu por si a ver vídeos de pessoas a abrir caixas misteriosas com criaturas de olhos desproporcionais e sorriso ligeiramente demoníaco, então já foi apanhada pela febre, como tantas outras pessoas.


Labubu é o novo objeto de desejo da cultura pop contemporânea. Um boneco com ar inquietante e colecionável, vendido em quantidades limitadas, que desperta em adultos uma excitação quase infantil. Do ponto de vista da psiquiatria diria, talvez de forma provocadora, que se trata de uma espécie de fuga emocional do mundo de hoje.


A psicologia da escassez: como desejar o que (quase) não se pode ter


Como psiquiatra e psicoterapeuta, é-me difícil não olhar para este fenómeno com um misto de fascínio e algum desassossego. A popularidade do Labubu não se explica pela sua utilidade, beleza ou sequer conforto. Explica-se por algo bem mais previsível: o comportamento humano.


A escassez cria desejo. A dificuldade em obter reforça o valor percebido do objeto. E o sentimento de pertença a um grupo “que tem” (seja o boneco raro, o modelo exclusivo ou a edição limitada) alimenta não só o ego como uma ilusão de identidade e inclusão. Em termos simples: o prazer não está no boneco, mas na conquista do mesmo. No facto de o ter conseguido antes dos outros.


Adiciona-se a isso a economia da atenção, o marketing emocional e uma certa carência coletiva de sentido e temos o cenário perfeito para criar uma obsessão com um objeto que, convenhamos, não faz mais nada a não ser adornar malas.


Comprar "felicidade" é fácil. Viver bem dá mais trabalho.


O problema não está em gostar de bonecos, nem em colecionar. Está naquilo que se projeta neles. O Labubu, ou qualquer outra versão do conceito da “compra mágica”, promete aquilo que todos queremos: alegria imediata, validação externa e um sentido fugaz de pertença. Mas é, na melhor das hipóteses, um substituto de curta duração.


A alternativa? Menos entusiasmante à primeira vista, mas mais duradoura: estar onde está. Valorizar o que já tem. Aprender a lidar com o vazio sem o cobrir imediatamente com mais um objeto, mais uma compra, mais um estímulo.


O Labubu não é o vilão. Mas também não é a solução.


Este texto não tem como objetivo condenar quem coleciona Labubus. É sobre perguntar, com alguma honestidade: está mesmo a colecionar bonecos, ou está a fugir de algo? A resposta pode não ser óbvia e, na maioria das vezes, não é. Mas merece ser explorada. Porque o que muitas pessoas procuram nos objetos é, na verdade, algo que só se encontra nas relações reais, no tempo desacelerado, na presença e atenção plenas. E, por vezes, na terapia.


E se, em vez de procurar o próximo Labubu, começasse a procurar-se a si? Pode parecer cliché, mas a verdade é que a maior parte das respostas que procuramos fora de nós começa com uma escuta interior que muitos evitam. Nem sempre é confortável, mas o caminho para a satisfação implica aceitar o desconforto que vem com a mudança. Se aquilo que procura não cabe numa prateleira, talvez seja tempo de criar espaço para uma nova forma de estar consigo, com os outros, com a sua vida.

 
 
 

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